quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Confira a entrevista com Angela Bellinati, oficial de mesa

Com 39 anos de carreira e aos 57 anos de idade, Angela Bellinati é a oficial de mesa mais experiente entre os convocados para trabalhar nos Jogos Olímpicos Rio 2016. Depois de superar o preconceito de não poder ser árbitra, Angela se tornou mesária em 1977. A oficial soma em seu currículo a experiência em competições internacionais como o Campeonato Mundial Adulto Feminino (São Paulo/2006), o Campeonato Mundial Sub-19 Feminino (Natal/1997), o Torneio Pré-Olímpico das Américas Feminino (São Paulo/1998 e 1993) e Masculino (São Paulo/1992), além da Copa América Masculina Sub-21 (Ribeirão Preto/2000), a Liga Sul-Americana de Clubes (Mogi das Cruzes/2014 e 2015), a Copa Intercontinental de Clubes (Barueri/2014), a Liga das Américas Feminina (São Paulo/2007) e o Campeonato Mundial de Clubes Feminino (Paulínia/1995) entre outros. Preparada e ansiosa para o início dos Jogos Rio 2016, de 5 a 21 de agosto, a mesária quer fazer bonito em casa.
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O que representa trabalhar nos Jogos Olímpicos Rio 2016?

Quando recebi a notificação que estava entre os selecionados, fiquei emocionada. Passamos por muita pressão e nervosismo para chegar até aqui, mas foi extremamente gratificante. Será uma grande experiência para fechar uma carreira de muitas competições. Não sei quando acontecerá outra Olímpiada no Brasil, mas tenho certeza que não haverá outra como essa. Quando digo que passamos pressão e nervoso foi uma coisa criada por nós mesmos, pois qualquer um gostaria de estar em nossos lugares, então precisamos nos dedicar muito. Tivemos três etapas de treinamento e mais o Evento-teste. Foi uma fase também muito gostosa, pois fizemos grandes amigos. A Fátima (Aparecida, coordenadora da arbitragem da CBB) é uma grande pessoa e agrega todos. Ficamos muito próximas dos estatísticos.

Como foi participar do Evento-teste?

Foi muito legal e inesquecível. Nos dois primeiros dias passamos por muitas palestras e aprendemos mecanismos novos que serão utilizados nos Jogos. Por exemplo, o dispositivo de tempo (24s) possui uma nova nomenclatura. Agora nós precisamos marcar os pontos e as faltas, e não só mais cantar como era feito anteriormente. Não dificultou o processo, mas é um novo jeito e precisamos treinar. Os engenheiros e técnicos que nos ensinaram foram muito pacientes e não deixaram dúvida pra ninguém. A paciência do ensinamento aumenta a responsabilidade. Além disso, em um evento destes estamos sendo observados o tempo todo.
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Você possui experiência em grandes competições nacionais e internacionais. Quais as lembranças mais marcantes?

Com certeza o Campeonato Mundial Feminino (2006) e o Mundial Sub-19 Feminino (1997), ambos no Brasil. São as lembranças e oportunidades mais marcantes que tive profissionalmente. Conheci muita gente nessas competições e tive a oportunidade de trabalhar com grandes árbitros internacionais da Alemanha, Marrocos e um japonês que forçava o português e vivia com um dicionário na mão. Foram momentos de boa convivência e emocionante experiência. Mas se tivesse que destacar apenas um campeonato seria o Evento-teste em janeiro deste ano. O grupo ficou muito unido e isso foi primordial para o sucesso do nosso trabalho, além, claro, do torneio ter sido extremamente bem organizado. Tudo culminou para o sucesso.
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E as histórias engraçadas?

Já passei por muita coisa e vi ainda mais no basquete. Já sai do ginásio de camburão nem sei mais quantas vezes. Teve uma que estávamos dentro do carro da policia e o público enfurecido sacudia tanto o carro que pensávamos que ia virar. Já defendi árbitro dentro de quadra, mas os melhores foram em competições que não eram oficiais e não valiam título. Como o jogo dos amigos do Oscar Schmidt contra os amigos do Magic Johnson realizado no Ibirapuera. Não sei muito se eram amigos, mas lembro que quando entraram em quadra pareciam os melhores. Foi muito legal e mais ainda porque trabalhei ao lado de grandes amigos como o Renatinho (Carlos Renato dos Santos) e o Sérgio Pacheco. Teve também a temporada do Harlem Globetrotters em São Paulo, em 1995. Era uma grande festa esse grupo. Jogavam a bola para as crianças encestarem, mexiam com os árbitros. A gente acaba se divertindo junto.

Como veio a vontade de se tornar uma oficial de mesa?

Comecei no basquete como a maioria das pessoas jogando na escola e faculdade, na minha época ser alta não era um pré-requisito. Depois durante a faculdade de educação física, vi em um mural o cartaz da Federação Paulista anunciando o curso de árbitros. Fui na mesma hora e me inscrevi, mas queria apitar. Infelizmente as mulheres não podiam apitar nessa época. Depois que estava há 12 anos trabalhando na Federação foi que o Geraldo Fontana, na época trabalhava na Paulista antes de se tornar coordenador de arbitragem da CBB (atualmente instrutor da FIBA Américas), começou a chamar as mulheres para arbitrar. Mas aí já não queria mais, então segui como mesária.
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Você trabalha como mesária há 39 anos. Era muito machismo e preconceito no início?

Não diria que era preconceito, mas mulheres não tinham a permissão de arbitrar apenas atuar na mesa. Tanto que nessa seleção de mesários para os Jogos Rio 2016 dez pessoas são mulheres e apenas dois homens. Sempre se teve mais mulheres como oficiais de mesa.

Além de ser oficial de mesa, atualmente você tem alguma outra função?

Sim. Me formei em educação física e dei aula até 1988 em escola, academia e clubes. Mas era o tipo de profissão que precisaria me dividir em mais de um emprego para ter um salário melhor, então deixei de dar aulas e comecei a trabalhar em uma clínica oftalmológica, onde atuo como gerente administrativa há 26 anos.

Como é o seu relacionamento com os árbitros?

Muito bom. Com os brasileiros, então maior ainda. Considero tão amigos que são irmãos, o Renatinho e o Pacheco. São muitos anos trabalhando juntos. Tive a oportunidade de trabalhar e me tornar amiga de grandes árbitros como José Augusto Piovesan, Marcelo Ávila, Vander Lobosco (pai e filho), Mauricio Serour, Cristiano Maranho e Fernando Serpa entre outros. No começo dos anos 80, viajar para trabalhar nos jogos do interior era festa. Sempre parávamos para comer depois dos jogos. Hoje a vida é mais corrida e não dá mais tempo de passarmos tanto tempo juntos.
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Você poderia citar os cinco melhores jogadores e as cinco melhores jogadoras que viu em sua carreira?

Vi grandes jogadores em quadra, mas vou citar os brasileiros. Entre as mulheres vi Magic Paula, Hortência Marcari, Janeth Arcan, Karina Rodrigues e Helen Luz. Já na ala masculina adorava ver em quadra Oscar Schmidt, Guerrinha (Jorge Guerra), Marcelo Vido e os irmãos Marcel e Maury de Souza. Gostava desses por serem todos focados e bem disciplinados. Hoje o treino de basquete dura em média duas horas e depois os jogadores vão embora. Na época desses jogadores, via eles em quadra depois da preparação fazendo treino de arremessos. Eram muito mais focados na profissão e tinham mais comprometimento com suas equipes e a seleção brasileira.
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Qual técnico deu mais trabalho?

Ah foram muitos (disse entre risos). Mas poderia citar Claudio Mortari, Lula Ferreira, que melhorou muito com o passar dos anos, Zé Boquinha, Micau (Luiz Carlos), Maria Helena Cardoso, José Neto e Gustavo Di Conti. Eles reclamavam muito na mesa falando de erros dos árbitros em quadra. Mas sempre foram chaturas fáceis de resolver e nada fora do comum. Acho que o técnico deveria aprender a reclamar. Tem que chegar tranquilo para falar com o árbitro. Sabemos que tem os dois lados, mas se chegar com o pé no peito do árbitro acaba levando uma falta técnica e prejudica a equipe.

O que você costuma fazer quando não está na quadra?

Geralmente estou trabalhando, mas quando não tem jogo ou estou de folga corro para casa da minha mãe em Atibaia, no interior de São Paulo. Adoro também viajar com minhas amigas.
CBB

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